quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Com a palavra... ALEXANDRE GUARNIERI




1) Alexandre Guarnieri, conte sobre sua carreira e o impacto da indicação ao prêmio Jabuti deste ano para o seu livro Corpo de festim (Ed. Confraria do vento, 2014).

AG - Nunca pensei na poesia como uma carreira (a não ser a acadêmica), mas penso que se o poeta sente necessidade de encontrar outros que estejam em sintonia com seus anseios éticos e estéticos, outros escritores ou gente do meio literário, e que para isso acabe organizando sua agenda pessoal em torno de saraus, feiras de livros, oficinas, eventos literários, lançamentos ou sinta necessidade de organizar seu tempo de leitura e produção, daí tudo isso pode acabar configurando algo que vagamente se assemelhe a uma carreira. Sendo esse o caso, a minha é bem desastrosa e irregular. Sempre me senti indisciplinado, assaltado pela poesia nos momentos menos convenientes. Sinto que poderia ler mais. Ainda prefiro acreditar que administrar carreira literária deveria ser trabalho de outros, editores, agentes literários, produtores culturais, captadores de recursos, organismos públicos, e não dos próprios artistas da palavra. Há a questão crucial da visibilidade. Pra você ser lido, as pessoas tem que saber que você existe, e sua produção tem que estar disponível.
Nesse caso, a indicação de finalista ao Jabuti pode ajudar bastante a despertar o interesse de quem está por aí, ávido por novas leituras. A profissionalização da atividade do escritor (a carreira) depende de uma cadeia enorme de outras atividades que lhe fogem do controle. A receita é apenas persistir. Escrever, escrever, escrever. Rasgar, reescrever, rasgar, reescrever, lutar contra a indisciplina, durante anos a fio. Meu primeiro livro, "Casa das Máquinas" (Editora da palavra, 2011), levou 15 anos pra ficar pronto. Afinal, somos nossos primeiros críticos, não é mesmo?

2) O que é a poesia para você?

AG - Poesia é criar um quebra-cabeças pra você mesmo resolver, é se deixar capturar por algum ruído e não parar de persegui-lo, é uma espécie de fisioterapia, onde a contusão "inspira", dor inicial, o incômodo, o problema, daí o poema é a busca da cura, de formas de controlar a dor, de conviver com ela. 

3) Como é o seu processo criativo?

AG - Irregular e variado. A necessidade do poema pode nascer de uma palavra ouvida de repente ou lida noutro livro, de uma cena de filme, de um solo de guitarra, ou tudo isso junto, é caos. Escrevo à mão em caderninhos, guardanapos, pedaços de papel. Escrevo no metrô, andando ou parado diante do computador. Gravo algumas falas no telefone celular, depois transcrevo e parto daí, ou finalizo assim. O poema é uma erupção vulcânica, quando a pressão aumenta, a fumaça sai pelo poro mais próximo.  

4) Fale um pouco sobre o seu poema “Aurélia” que está no livro Sobre Lagartas e Borboletas (Tubap Books/Scenarium, 2015).

AG - Topei participar porque a crisálida e a borboleta, enquanto metáforas, também falam do ato criador, de transformação, de alquimia e transmutação; depois, veio o erotismo, embutindo nas asas da borboleta os lábios de uma vagina, e persegui essa imagem pensando em mulheres que se viram presas, apartadas do prazer, mas superaram traumas e se permitiram renascer, daí a imagem final: o orgasmo como libertação. Agradeço demais a oportunidade e o convite para participar da antologia.

5) Guarnieri por Guarnieri: lagarta ou borboleta?

AG - Certamente, os dois, em constante mistura, aparição e desaparição. Vida e morte nos perseguem nos detalhes, nas escolhas, como símbolos, nos acompanham e nos moldam. A lagarta morre para que a borboleta possa nascer, e sempre há algum aspecto nosso que precisa morrer, para que possamos nos transformar, seguir jornada, aceitando a impermanência.





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