1)
Alexandre Guarnieri, conte sobre sua carreira e o impacto da indicação ao
prêmio Jabuti deste ano para o seu livro Corpo
de festim (Ed. Confraria do vento, 2014).
AG - Nunca pensei na
poesia como uma carreira (a não ser a acadêmica), mas penso que se o poeta
sente necessidade de encontrar outros que estejam em sintonia com seus anseios
éticos e estéticos, outros escritores ou gente do meio literário, e que para
isso acabe organizando sua agenda pessoal em torno de saraus, feiras de livros,
oficinas, eventos literários, lançamentos ou sinta necessidade de organizar seu
tempo de leitura e produção, daí tudo isso pode acabar configurando algo que
vagamente se assemelhe a uma carreira. Sendo esse o caso, a minha é bem
desastrosa e irregular. Sempre me senti indisciplinado, assaltado pela poesia
nos momentos menos convenientes. Sinto que poderia ler mais. Ainda prefiro
acreditar que administrar carreira literária deveria ser trabalho de outros,
editores, agentes literários, produtores culturais, captadores de recursos,
organismos públicos, e não dos próprios artistas da palavra. Há a questão
crucial da visibilidade. Pra você ser lido, as pessoas tem que saber que você
existe, e sua produção tem que estar disponível.
Nesse caso, a
indicação de finalista ao Jabuti pode ajudar bastante a despertar o interesse
de quem está por aí, ávido por novas leituras. A profissionalização da
atividade do escritor (a carreira) depende de uma cadeia enorme de outras
atividades que lhe fogem do controle. A receita é apenas persistir. Escrever,
escrever, escrever. Rasgar, reescrever, rasgar, reescrever, lutar contra a
indisciplina, durante anos a fio. Meu primeiro livro, "Casa das
Máquinas" (Editora da palavra, 2011), levou 15 anos pra ficar pronto.
Afinal, somos nossos primeiros críticos, não é mesmo?
2)
O que é a poesia para você?
AG - Poesia é criar um
quebra-cabeças pra você mesmo resolver, é se deixar capturar por algum ruído e
não parar de persegui-lo, é uma espécie de fisioterapia, onde a contusão
"inspira", dor inicial, o incômodo, o problema, daí o poema é a busca
da cura, de formas de controlar a dor, de conviver com ela.
3)
Como é o seu processo criativo?
AG - Irregular e variado.
A necessidade do poema pode nascer de uma palavra ouvida de repente ou lida
noutro livro, de uma cena de filme, de um solo de guitarra, ou tudo isso junto,
é caos. Escrevo à mão em caderninhos, guardanapos, pedaços de papel. Escrevo no
metrô, andando ou parado diante do computador. Gravo algumas falas no telefone
celular, depois transcrevo e parto daí, ou finalizo assim. O poema é uma
erupção vulcânica, quando a pressão aumenta, a fumaça sai pelo poro mais
próximo.
4)
Fale um pouco sobre o seu poema “Aurélia” que está no livro Sobre Lagartas e
Borboletas (Tubap Books/Scenarium, 2015).
AG - Topei participar
porque a crisálida e a borboleta, enquanto metáforas, também falam do ato
criador, de transformação, de alquimia e transmutação; depois, veio o erotismo,
embutindo nas asas da borboleta os lábios de uma vagina, e persegui essa imagem
pensando em mulheres que se viram presas, apartadas do prazer, mas superaram
traumas e se permitiram renascer, daí a imagem final: o orgasmo como
libertação. Agradeço demais a oportunidade e o convite para participar da
antologia.
5)
Guarnieri por Guarnieri: lagarta ou borboleta?
AG - Certamente, os dois,
em constante mistura, aparição e desaparição. Vida e morte nos perseguem nos
detalhes, nas escolhas, como símbolos, nos acompanham e nos moldam. A lagarta
morre para que a borboleta possa nascer, e sempre há algum aspecto nosso que
precisa morrer, para que possamos nos transformar, seguir jornada, aceitando a
impermanência.
Bela entrevista. Breve e enorme.
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